Obrigação de Fazer e Indenização no Direito Ambiental. A cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não configura bis in idem, porquanto a indenização, em vez de considerar lesão específica já ecologicamente restaurada ou a ser restaurada, põe o foco em parcela do dano que, embora causada pelo mesmo comportamento pretérito do agente, apresenta efeitos deletérios de cunho futuro, irreparável ou intangível. Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça – STJ no REsp 1454281/MG.
Obrigação de Fazer e Indenização no Direito Ambiental.
Nesta postagem vamos observar, de forma objetiva, o entendimento do STJ sobre a cumulação de obrigação de fazer com a indenização no direito ambiental.
Responsabilidade civil pelo dano ambiental
De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, (como se pode observar no REsp 1454281/MG.) a responsabilidade civil pelo dano ambiental, qualquer que seja a qualificação jurídica do degradador, público ou privado, é de natureza:
- objetiva,
- solidária e
- ilimitada,
Ainda, para o Tribunal, a responsabilidade ambiental é regida pelos princípios:
- poluidor-pagador,
- da reparação in integrum,
- da prioridade da reparação in natura e
- do favor debilis, este último a legitimar uma série de técnicas de facilitação do acesso à justiça, entre as quais se inclui a inversão do ônus da prova em favor da vítima ambiental.
O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é pacificado no sentido de que, "a restauração in natura nem sempre é suficiente para reverter ou recompor integralmente, no terreno da responsabilidade civil, o dano ambiental causado, daí não exaurir o universo dos deveres associados aos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum. A reparação ambiental deve ser feita da forma mais completa possível, de modo que a condenação a recuperar a área lesionada não exclui o dever de indenizar, sobretudo pelo dano que permanece entre a sua ocorrência e o pleno restabelecimento do meio ambiente afetado (= dano interino ou intermediário), bem como pelo dano moral coletivo e pelo dano residual (= degradação ambiental que subsiste, não obstante todos os esforços de restauração)" (STJ, REsp 1.180.078/MG, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 28/02/2012).
A jurisprudência do STJ está firmada no sentido da viabilidade, no âmbito da Lei 7.347/85 e da Lei 6.938/81, de cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar. Neste sentido veja REsp 1.145.083/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 4.9.2012;
Confira abaixo três julgados sobre o tema
REsp 1454281/MG
PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ÁREA NON AEDIFICANDI. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - APP. DEGRADAÇÃO DECORRENTE DE EDIFICAÇÕES. CONDENAÇÃO A OBRIGAÇÕES DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO.
1. Trata-se na origem de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais voltada à recuperação de Área de Preservação Permanente degradada.
2. Não se configura a ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada.
3. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a responsabilidade civil pelo dano ambiental, qualquer que seja a qualificação jurídica do degradador, público ou privado, é de natureza objetiva, solidária e ilimitada, sendo regida pelos princípios poluidor-pagador, da reparação in integrum, da
prioridade da reparação in natura e do favor debilis, este último a legitimar uma série de técnicas de facilitação do acesso à justiça, entre as quais se inclui a inversão do ônus da prova em favor da vítima ambiental.
4. Induvidosa a prescrição do legislador, no que se refere à posição intangível e ao caráter non aedificandi da APP, nela interditando ocupação ou constrição, com pouquíssimas exceções (casos de utilidade pública e interesse social).
5. Causa inequívoco dano ecológico quem desmata, ocupa ou explora APP, ou impede sua regeneração, comportamento de que emerge obrigação propter rem de restaurar na sua plenitude e indenizar o meio ambiente degradado e terceiros afetados, sob regime de responsabilidade civil objetiva. São inúmeros os precedentes do STJ nessa linha: AgRg no REsp 1.494.988/MS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 9.10.2015; REsp 1.247.140/PR, Rel.
Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, 22.11.2011; REsp 1.307.938/GO, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 16.9.2014; AgRg no REsp 1.367.968/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 12.3.2014; EDcl no Ag 1.224.056/SP, Rel.
Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 6.8.2010; REsp 1.175.907/MG, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 25.9.2014.
6. A cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não configura bis in idem, porquanto a indenização, em vez de considerar lesão específica já ecologicamente restaurada ou a ser restaurada, põe o foco em parcela do dano que, embora causada pelo mesmo comportamento pretérito do agente, apresenta efeitos deletérios de cunho futuro, irreparável ou intangível. Nesse sentido: AgRg no REsp 1.545.276/SC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 13.4.2016; REsp 1.264.250/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 11.11.2011; REsp 1.382.999/SC, Rel.
Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 18.9.2014.
7. Recurso Especial provido para determinar a recuperação da área afetada, reconhecendo-se a possibilidade de cumulação de obrigação de fazer com pagamento de indenização, esta última a ser fixada na origem.
(REsp 1454281/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/08/2016, DJe 09/09/2016)
AgInt no REsp 1532643/SC,
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ALEGADA OFENSA AO ART. 535 DO CPC/73.
INEXISTÊNCIA. APONTADA VIOLAÇÃO A LEI ESTADUAL. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE. SÚMULA 280/STF. AFRONTA AOS ARTS. 48 E 292, §1º, II, DO CPC/73 E ART. 3º, V, DA LEI 6.938/81. SÚMULA 284/STF. LICENCIAMENTO AMBIENTAL MUNICIPAL. ATUAÇÃO SUPLETIVA DO IBAMA. POSSIBILIDADE.
JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO STJ. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E DE PAGAR QUANTIA CERTA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ.
PRETENDIDA REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. ALEGAÇÃO DE JULGAMENTO CONTRÁRIO À PROVA DOS AUTOS. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE.
SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. I. Agravo interno aviado contra decisão publicada em 16/06/2017, que, por sua vez, julgara recurso interposto contra decisum publicado na vigência do CPC/73.
II. Na origem, o Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública, em face de Dilmo Wanderley Berger, Cristiane Fontoura Berger, Fundação Municipal do Meio Ambiente de Florianópolis (FLORAM), Município de Florianópolis e União, visando a cessação de danos ambientais, em virtude do uso indevido de área non aedificandi, formada por promontório e terrenos de marinha, localizada no Bairro Coqueiros, em Florianopólis/SC, bem como a recuperação de área degradada.
III. Não há falar, na hipótese, em violação ao art. 535 do CPC/73, porquanto a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, de vez que os votos condutores do acórdão recorrido e do acórdão proferido em sede de Embargos de Declaração apreciaram fundamentadamente, de modo coerente e completo, as questões necessárias à solução da controvérsia, dando-lhes, contudo, solução jurídica diversa da pretendida.
IV. O exame de normas de caráter local é inviável, na via do Recurso Especial, em virtude da vedação prevista na Súmula 280 do STF, por analogia, segundo a qual "por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário". V. O Recurso Especial interposto é manifestamente inadmissível, em relação à alegada violação aos arts.
48 e 292, §1º, II, do CPC/73 e art. 3º, V, da Lei 6.938/81, uma vez que tais dispositivos legais não possuem comando normativo suficiente apto a sustentar a tese de incompetência da Justiça Federal, de forma a atrair, no ponto, a Súmula 284/STF.
VI. Na forma da jurisprudência do STJ, "não há falar em competência exclusiva de um ente da federação para promover medidas protetivas.
Impõe-se amplo aparato de fiscalização a ser exercido pelos quatro entes federados, independentemente do local onde a ameaça ou o dano estejam ocorrendo. O Poder de Polícia Ambiental pode - e deve - ser exercido por todos os entes da Federação,
pois se trata de competência comum, prevista constitucionalmente. Portanto, a competência material para o trato das questões ambiental é comum a todos os entes. Diante de uma infração ambiental, os agentes de fiscalização ambiental federal, estadual ou municipal terão o dever de agir imediatamente, obstando a perpetuação da infração" (STJ, AgRg no REsp 1.417.023/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 25/08/2015). No mesmo sentido: STJ, REsp 1.560.916/AL, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe de 09/12/2016;
AgInt no REsp 1.484.933/CE, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 29/03/2017.
VII. Consoante entendimento do STJ, "a restauração in natura nem sempre é suficiente para reverter ou recompor integralmente, no terreno da responsabilidade civil, o dano ambiental causado, daí não exaurir o universo dos deveres associados aos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum. A reparação ambiental deve ser feita da forma mais completa possível, de modo que a condenação a recuperar a área lesionada não exclui o dever de indenizar, sobretudo pelo dano que permanece entre a sua ocorrência e o pleno restabelecimento do meio ambiente afetado (= dano interino ou intermediário), bem como pelo dano moral coletivo e pelo dano residual (= degradação ambiental que subsiste, não obstante todos os esforços de restauração)" (STJ, REsp 1.180.078/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 28/02/2012). Em igual sentido: STJ, AgInt no REsp 1.196.027/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 27/03/2017; REsp 1.255.127/MG, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 12/09/2016.
VIII. O Tribunal de origem, à luz das provas dos autos e em vista das circunstâncias fáticas do caso, manteve o quantum indenizatório em R$ 100.000,00 (cem mil reais), valor que não se mostra excessivo, diante das peculiaridades da causa, expostas no acórdão recorrido, no sentido de que, "não obstante a implantação de plano de recuperação da área, a reparação não será integral, visto que, já tendo sido detonadas as rochas, inviável o retorno ao status quo ante, sendo, ainda, impossível se mensurar economicamente a perda para a sociedade, do ponto de vista paisagístico". Incidência da Súmula 7/STJ.
IX. Na forma da jurisprudência, "nos termos dos arts. 131 e 436 do CPC/73, o juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo apreciar livremente a prova e formar a sua convicção com outros elementos constantes nos autos, contanto que fundamente os motivos do seu convencimento" (STJ, AgInt no AREsp 977.035/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe de 27/04/2017).
X. Na hipótese, a Corte de origem, fundamentadamente, afastou a conclusão do laudo pericial, ressaltando que "o Decreto n. 14.250/81 traz definição suficientemente clara a respeito da caracterização de promontório para os fins de proteção ambiental no âmbito do Estado de Santa Catarina, descrevendo-os como elevação costeira florestada ou não que compõe a paisagem litorânea do continente ou de ilhas".
Assim, concluiu que, "pelo que se depreende da prova produzida nos autos, o local objeto da lide está localizado em Zona Costeira e trata-se de uma elevação (21,90 m) que contém espécies vegetais e rochas. Trata-se, também, de área que representa um avanço das rochas do continente no oceano, como afirma o perito em resposta a quesito formulado pelo Ministério Público Federal (fl. 516), enquadrando-se, pois, no conceito legal de promontório". De tal modo, a inversão dos fundamentos do acórdão recorrido - que, fundamentadamente, afastou a conclusão do laudo pericial - demandaria a análise do conjunto fático-probatório dos autos, de modo a atrair a incidência da Súmula 7/STJ, no ponto.
XI. Agravo interno improvido.
(AgInt no REsp 1532643/SC, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/10/2017, DJe 23/10/2017)
REsp 1669185/RS
AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. CUMULAÇÃO DE AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM INDENIZAÇÃO. POSSIBILIDADE DE REPARAÇÃO TOTAL DA ÁREA DEGRADADA. PEDIDO INDENIZATÓRIO DEFERIDO. PRINCÍPIOS DA REPARAÇÃO INTEGRAL, DO POLUIDOR-PAGADOR E DO USUÁRIO-PAGADOR. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER (REPARAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA) COM A DE PAGAR QUANTIA CERTA (INDENIZAÇÃO). REDUCTIO AD PRISTINUM STATUM. DANO AMBIENTAL INTERMEDIÁRIO, RESIDUAL E MORAL COLETIVO. ART. 5º DA LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL. INTERPRETAÇÃO IN DUBIO PRO NATURA DA NORMA AMBIENTAL. REVISÃO DE POSICIONAMENTO DO TRIBUNAL A QUO.
1. Cuida-se de inconformismo com a decisão do Tribunal de origem que condenou os réus à reparação da área degradada e entendeu incabível o pedido de condená-los ao pagamento de indenização pecuniária porque seria possível a reconstituição da área devastada.
2. De antemão, no que concerne à alegação de nulidade recursal trazida pelo IBAMA, constata-se que não se configura a ofensa ao art. 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, como lhe foi apresentada.
3. A jurisprudência do STJ está firmada no sentido da viabilidade, no âmbito da Lei 7.347/85 e da Lei 6.938/81, de cumulação de obrigações de fazer, de não fazer e de indenizar (REsp 1.145.083/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 4.9.2012; REsp 1.178.294/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 10.9.2010; AgRg nos EDcl no Ag 1.156.486/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 27.4.2011; REsp 1.120.117/AC, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 19.11.2009; REsp 1.090.968/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 3.8.2010; REsp 605.323/MG, Rel. Ministro José Delgado, Rel. p/ Acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ 17.10.2005; REsp 625.249/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 31.8.2006, entre outros).
4. Recursos Especiais do IBAMA e do MPF aos quais se dá parcial provimento para reconhecer a possibilidade, em tese, de cumulação de indenização pecuniária com as obrigações de fazer e de não fazer voltadas à recomposição in natura do bem lesado, com a devolução dos autos ao Tribunal a quo para que verifique se, na hipótese, há dano indenizável e fixe eventual quantum debeatur.
(REsp 1669185/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/09/2017, DJe 20/10/2017)
Veja também
Concluindo, com amplos argumentos o Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que é possível a cumulação da Obrigação de Fazer ou Não fazer com a Indenização no Direito Ambiental.